Mesmo com arma de fogo na cintura, cassetete na mão e viatura plotada, nenhum guarda municipal tem poder de polícia ostensiva ou investigativa; é a essa conclusão que o advogado criminalista Plalton Veríssimo chega, na entrevista reproduzida abaixo.
MARAGOGIRO — Gostaria que o senhor expusesse aos nossos seguidores as prerrogativas, poderes e deveres do guarda municipal, quando amparadas por lei municipal.
PLALTON — A Constituição Federal trata deste assunto no seu artigo 144, parágrafo 8º, onde foi criado o estatuto da guarda municipal por obrigatoriedade deste parágrafo, que em 2014 foi criada a Lei Nº 13.022, de 8 de agosto de 2014, 13000/2014. Lá institui a criação, princípios, funções e prerrogativas da guarda municipal. Mas já adianto: guarda municipal não é polícia, inclusive essa lei reconhece.
MARAGOGIRO — A guarda municipal foi incluída na Lei Nº 13.675, de 11 de junho de 2018, quando foi criado o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). Ainda assim, a guarda não tem força de polícia?
PLALTON — A guarda municipal foi encaixada no SUSP apenas como órgão auxiliar, ou seja, órgão de cooperação, que é diferente de órgão de atuação. Veja, não vou nem buscar em outra lei, pois no próprio artigo 2º e 4º do Estatuto da Guarda Municipal diz tudo: “incumbe às guardas municipais, instituição de caráter civil, uniformizadas e armadas, conforme previsto em lei” — isto significa que tem requisitos a ser seguido — “a função de proteção municipal preventiva, ressalvada a competência da União nos Estados e no Distrito Federal”. Se é ressalvado, a guarda municipal não pode entrar na competência da Polícia Civil ou Militar, ou seja, seu dever é está vigilante em frente a um colégio, uma praça, no hospital, ou em qualquer outro órgão do município, com o poder apenas de proteção preventiva ao patrimônio municipal. Os princípios da guarda são de fazer segurança aos órgãos públicos para inibir, observando também o artigo 3º, que no mínimo tem que proteger os direitos humanos, com respeito, sem atingir a dignidade da pessoa humana.
MARAGOGIRO — Caso um guarda municipal esteja a serviço do município em uma festa pública, de rua, e comece a usar da força como se fosse polícia ostensiva e agrida um folião, o que deve ser feito? Pois nós da imprensa já presenciamos este tipo de arbitrariedade em várias cidades da região.
PLALTON — O exercício da cidadania e da liberdade pública, ou seja, qualquer força de segurança, é obrigada a manter a proteção das pessoas, e não reprimir de forma deliberada esse tipo de conduta. A providência a ser tomada de imediato é ir na delegacia local e abrir um Boletim de Ocorrência, onde o delegado identificará qual foi o crime cometido pelo agente público. E, se foi agredido, o cidadão deve solicitar ao delegado de polícia uma requisição para fazer exame de corpo de delito. Em seguida, a pessoa deve ir ao Ministério Público fazer uma representação contra o agressor. Independente de qualquer coisa, o MP é fiscal da Lei.
MARAGOGIRO — Quando falamos em polícia, lembramos que existe uma hierarquia na corporação. Uma vez que não existe hierarquia na guarda municipal, não é perigoso armar esse pessoal?
PLALTON — As pessoas confundem a guarda com a guarda armada. A guarda armada tem mil e um requisitos a serem seguidos: a guarda armada tem de ter corregedoria, ouvidoria, autorização da Polícia Federal, registro no Conselho Nacional de Justiça e um código de disciplina, e todos os agentes devem ser concursados para a função específica, resguardado de uma boa preparação, como também um local propício para guardar as armas da instituição. Entretanto, deve haver uma lei municipal para criação da guarda, caso contrário, não existe guarda municipal. Não é simplesmente o cara ter uma arma, o registro dela e uma carteira funcional que pode usar em serviço. Isso é proibido, só pode com autorização da Polícia Federal para o órgão.
MARAGOGIRO — Para encerrar a entrevista e chegar à conclusão, pergunto: Caso fosse implantada uma guarda municipal que cumprisse todos os requisitos que o senhor citou, um agente dessa guarda poderia se achar policial?
PLALTON — De jeito nenhum. Não é função de um guarda municipal prender ninguém se não for em flagrante delito, pois o artigo 301 do Código de Processo Penal dá esse direito a qualquer cidadão. Porém, não é obrigado. No entanto a autoridade policial tem a obrigação, o poder e o dever de cumprir; já a guarda municipal não, porque o próprio Artigo 144 da Constituição Federal diz: autoridade policial está elecado no caput e no incisos. Lembremos que antigamente existia o agente penitenciário, agora é Polícia Penal, era uma briga de longas datas onde os agentes não podiam ser chamados de Polícia, mas para isso ser concretizado deveria existir uma Emenda Constitucional, que foi implementada pela emenda 104, inciso 6º do artigo 144 que deu status de polícia aos agentes penitenciários. Um guarda municipal ser chamado de polícia, só quando houver outra emenda constitucional.
A segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, exercida para preservação da ordem pública, do patrimônio do cidadão através dos seguintes órgãos: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Polícia Civil, Polícia Militar e Bombeiros Militares acrescidos do inciso 6º, Polícias Penais, Federais e Distritais. São esses os órgãos das polícias brasileiras. Os demais são auxiliares de segurança pública.
Ainda no rol do direito administrativo, alguns órgãos da administração pública direta — prefeituras, estados e União — detêm órgãos fiscalizadores: vigilância sanitária, secretaria de obras, Anvisa, entre outros. Estes podem, se necessário, usar o poder de polícia. Trata-se, no entanto, de um poder administrativo, de caráter predominantemente preventivo, que incidirá sobre bens, direitos e atividades com o objetivo de prevenir ou reprimir ilícitos administrativos e é norteada pelo Direito Administrativo. Já o poder de polícia judiciária incide sobre pessoas, de maneira ostensiva ou investigativa.
É competência geral das guardas municipais a proteção dos bens e serviços, logradouros públicos municipais e instalações do município. Neste caso, a guarda municipal não tem competência de fazer revista pessoal, nem de perseguir, salvo em flagrante delito, caso em que o direito é de qualquer cidadão.